Empresas que não formalizam corretamente o abandono de emprego podem enfrentar sérias consequências jurídicas. Uma recente decisão da Justiça do Trabalho reforçou a necessidade de adotar procedimentos documentados, como o envio de telegrama com aviso de recebimento, para evitar reintegrações e indenizações.

Ausência de formalização pode anular a demissão

Um caso julgado pela 3ª Vara do Trabalho de Santo André (SP) condenou uma empresa por demitir uma funcionária sob a alegação de abandono de emprego sem qualquer comprovação de notificação formal. O tribunal considerou a dispensa inválida e determinou:

  • Reintegração da trabalhadora;
  • Indenização por danos morais no valor de R$ 30 mil;
  • Pagamento de verbas trabalhistas retroativas ao período de afastamento.

A falta de comunicação formal pesou na decisão. A empresa não conseguiu demonstrar que tentou, de forma documentada, restabelecer o vínculo antes da rescisão.

Elemento subjetivo é essencial para configurar o abandono

Para que o abandono de emprego seja juridicamente válido, dois elementos devem estar presentes:

  • Ausência injustificada e prolongada do empregado;
  • Intenção clara (elemento subjetivo) de não retornar ao trabalho.

O juiz destacou que a intenção de abandonar o trabalho não ficou comprovada, pois não houve qualquer tentativa de contato formal com a colaboradora. O simples afastamento não é suficiente — é preciso evidenciar que o trabalhador não deseja mais manter o vínculo.

Reintegração e danos morais: riscos para as empresas

A decisão judicial reforça que a responsabilidade de convocar o trabalhador é do empregador. A ausência de medidas formais configura uma demissão indevida, sujeita a:

  • Reintegração ao cargo anterior;
  • Pagamentos retroativos de salários e benefícios;
  • Indenizações por danos morais, especialmente quando há impacto à dignidade do trabalhador.

Além disso, o magistrado ressaltou que problemas de saúde podem justificar ausências prolongadas, exigindo postura cautelosa das empresas.

Convocação formal é obrigação legal do empregador

A jurisprudência trabalhista é clara: o empregador deve tentar restabelecer contato antes de caracterizar abandono. As formas mais aceitas para notificação são:

  • Telegrama com aviso de recebimento (AR);
  • Carta registrada com confirmação de entrega;
  • E-mail corporativo com confirmação de leitura;
  • Outros meios que permitam comprovar o envio e o recebimento.

O objetivo é garantir que o trabalhador tenha ciência da ausência e da necessidade de justificar ou retornar.

Procedimentos recomendados para evitar riscos jurídicos

Empresas, contadores e profissionais de RH devem seguir uma rotina padronizada sempre que houver ausência injustificada. Veja as práticas recomendadas:

1. Enviar notificação formal documentada

Identificada a ausência prolongada (em geral, acima de 30 dias), a empresa deve formalizar a convocação com documento que comprove o envio. O telegrama com AR continua sendo o método mais seguro.

2. Estabelecer prazo para resposta

O comunicado deve informar um prazo razoável para manifestação do trabalhador — normalmente de 5 a 10 dias úteis — e deixar claro as consequências do não comparecimento.

3. Arquivar todas as comunicações

É essencial guardar cópias da notificação, comprovantes de envio, eventuais respostas do trabalhador e registros internos. Essa documentação servirá como prova em eventual ação judicial.

4. Verificar possíveis justificativas médicas

Em caso de suspeita de problemas de saúde, a empresa deve solicitar atestados médicos ou, se possível, encaminhar o colaborador para avaliação médica.

Situações que não configuram abandono de emprego

Nem toda ausência prolongada caracteriza abandono. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) já consolidou o entendimento de que o afastamento não basta por si só para justificar demissão por abandono, especialmente quando:

  • atestados médicos, mesmo que entregues com atraso;
  • O trabalhador tenta justificar a ausência, ainda que informalmente;
  • A empresa não realizou nenhuma tentativa de contato antes da dispensa.

Esses casos exigem avaliação individualizada e maior cautela por parte dos gestores e RH.

Impacto para empresas e contadores

Falhas nos procedimentos de abandono de emprego podem gerar:

  • Reintegrações compulsórias;
  • Ações por danos morais com valores elevados;
  • Passivos trabalhistas inesperados.

Dessa forma, é fundamental que contadores, advogados e profissionais de RH orientem seus clientes a seguir rigorosamente a formalização da convocação e o registro de toda comunicação com o empregado.

Atuação preventiva reduz riscos trabalhistas

A caracterização válida do abandono exige provas objetivas e documentadas, tanto da ausência prolongada quanto da intenção de não retornar. A simples falta sem justificativa, sem que a empresa tenha feito convocação formal, não é suficiente para fundamentar a demissão.

Empresas devem:

  • Padronizar os procedimentos de convocação;
  • Registrar todas as tentativas de contato;
  • Agir com cautela em casos que possam envolver afastamento médico.

A prevenção e a formalização são as melhores estratégias para evitar litígios e garantir segurança jurídica nas decisões de desligamento.

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